Estes 120 dias que nos distanciam fisicamente tem trazido uma incontável lista
de incertezas, mas uma grande e inabalável certeza: do meu amor e gratidão pela
tua presença em minha vida.
E é sobre PRESENÇA que quero te falar.
Presença paterna é aquela que nos resgata do estado de desamparo, nos conforta
e nos apresenta a vida com suas belezas e obstáculos. Que nos protege e mostra
os limites. Que nos fornece segurança e momentos de certeza de amparo
incondicional. Que permite por vezes nos fazer acreditar que nosso super herói
pode nos salvar; que nosso primeiro príncipe pode ser encantado e que se o
‘substituirmos’, ele inda assim ficará feliz com nossa felicidade.
Presença paterna é que nos leva ao estádio, às pescarias, à ferragem aos
sábados… aquela que nos ensina a andar de ônibus, a dirigir… a aprender a dizer
não. Aquela que assume sem conflito os cuidados ditos “maternos”, cortando
unhas, penteando uma barbie ou embalando um choro de amor perdido.
É a que monta seu autorama guardado como relíquia e acaba jogando
Playstation com seus filhos.
Presença que sobrevive o questionamento e conflito com filhos adolescentes.
Presença paterna é aquela que na dor, nos momentos de perda, separação,
morte… é presença firme.
Aquela que acata as escolhas e encaminhamentos dos filhos e passa a ser uma
presença que acompanha.
Presença na luta por justiça e dignidade.
Presença no olhar aos netos, nas suas singularidades…
Esta presença ao longo do tempo se transforma em patrimônio inalienável.
Sólido.
Esta presença nunca é absoluta, não ocupa todo o espaço, mas fica ali, como uma
referência, um recurso que ora inspira, ora acalenta, ora dialoga e estabelece
uma tensão reflexiva, ora convida para uma caminhada…
Presença no tamanho certo, sem fazer sombra para os filhos.
Existem pais-mães e existem mães- pais.
Existem pais que já se foram, mas seguem vivos em seus filhos.
Existem pais que estão nascendo.
E aqueles que quando avós podem retomar sua paternidade a partir de um novo
lugar.
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¹Escrevo esta ‘outra’ carta, pois a de Kafka é a carta endereçada a um pai
diametralmente oposto. Uma carta em que Kafka busca exorcizar o pai
primordial, tirano e que não se encaixa no que tenho na mente como
conceito de “pai”.
Termino esta carta lamentando que não temos como sociedade uma
liderança com nenhuma destas presenças que o colocariam no lugar de
pai. Nem no lugar do pai de Kafka… que ao menos, apesar de ser cruel e
perverso no trato com os filhos, provia sustento e sobrevivência a família.
Estamos órfãos.
Escrever uma mensagem de dia dos pais é escrever para meu pai. E é escrever
através desta carta, para todos pais do nosso IEPP.
Ana Cristina Pandolfo
Psicologa docente e supervisora do IEPP
Psicanalista SPPA