por Heloísa Tonetto (Psicóloga, Docente e Supervisora do IEPP, Psicanalista – SPPA)
Descortina-se uma cena: a paciente, lentamente, acorda do efeito anestésico logo após a indicada e necessária mastectomia parcial. A seu lado, o cirurgião, atento à sua retomada de consciência, delicadamente, pega e conduz sua mão ao próprio peito, exatamente no local da prótese que preencheu o espaço esvaziado. Naquele importante momento, ocorre a conexão afetiva entre a paciente e seu médico, este muito sensível às angústias de perda e de mudança corporal que envolvem a retirada da mama para uma mulher. Nenhuma palavra foi dita, mas um simples gesto humanizou a situação traumática, oferecendo condições para a paciente lidar com seu luto e gerar uma perspectiva de reparação.
Esta é uma história, assim como tantas outras. Muitas mulheres têm a sorte e a oportunidade de contar com uma rede de suporte que ampara e ajuda nesse processo de enfrentamento. Equipe médica/psicológica, familiares, amigos, encontro com um grupo de iguais, são alguns dos recursos importantes para uma passagem o menos dolorosa possível. O movimento que alguns anos vem mobilizando a população – o Outubro Rosa – além do alerta preventivo, também nos notifica o quanto é necessário estarmos sensíveis a essas situações.
O Outubro Rosa nos convoca à reflexão do significado das mamas para a mulher, tanto no nível de sua identidade feminina, como valor estético. Desde sua infância e puberdade, a menina investe, espera o desenvolvimento e a chegada deste encontro com o corpo de mulher. Sabe, intuitivamente, que o seio tem uma representação extremamente importante na sua subjetividade sexual, pois constitui uma zona erógena por excelência, incluído no conjunto das sensibilidades corporais, rumo ao prazer orgástico. Também nosso olhar recai na importância que ele tem na amamentação. O seio é quem dá a primeira notícia de mundo para o bebê. Este vai saciar a necessidade da fome, na qual se apoia a primeira experiência de satisfação, abrindo também os enlaces com o prazer da fase oral. Amamentar é prazeroso não só para o bebê, mas também para a mãe. Este encaixe boca-mamilo é estruturante na vida do humano, gerando espaços mentais e facilitando o desenvolvimento no rumo de uma mente adulta.
Esse Outubro igualmente nos alerta, para nós mulheres, o quanto é importante o contato que devemos ter com o nosso próprio corpo, estarmos atentas às suas mudanças e sensações. Quem mais sabe dele somos nós mesmas, seu ritmo, seus movimentos, suas manifestações intensas, suas ligações. Enfim, habitamos um corpo e precisamos dele para nos levar aos projetos deste percurso chamado Vida.