Então nossa vida em poucos dias mudou radicalmente. Nossas referências não são mais a mesmas, nosso ritmo é outro. Fomos parados por uma força que desconhecemos que é invisível e perigosa. Nossa mente adulta está movimentando-se como um furacão. Todos temos tido horas de extrema angústia, ansiedades e preocupações que tem diversos nomes, dependendo do momento do dia que estamos vivendo. Como mãe e Psicóloga infantil, tenho me questionado e ouvido questionamentos dos mais diversos:
O que fazer com as crianças nesse tempo ocioso? Quais as melhores atividades? Quais dicas que tens para dar? Em tão pouco tempo já recebi centenas de atividades para fazer em casa com as crianças. E me senti atropelada com tudo isso. E, acima de tudo culpada, por não ter ainda começado o “check list” de atividades que uma boa mãe deve fazer.
Mas porque insistentemente estamos angustiados em “salvar” as nossas crianças do tédio e da falta de uma vida lá fora? Talvez o desespero não seja delas (pelo que me consta estão indo muito bem), mas sim nosso. Somos nós que estamos perdidos, e com muito medo de nos desorganizarmos frente essa vida que se apresenta e que nos é desconhecida. A rota do GPS não nos mostra mais o caminho. Logo nós, pais da geração do controle, dos eletrônicos, e dos infinitos manuais de como ser bom pai e boa mãe. Sim. Estamos perdidos.
Por isso, antes de sair em busca de tantas tarefas e atividades para os nossos pequenos, talvez possamos entrar dentro do que temos, para então nos salvarmos. Não é o momento de exigências de perfeição, mas sim, de nos sintonizarmos com o que nos faz sentido. Assim como para algumas famílias montar uma roteiro de tarefas pode ser excelente, para outras, deixar o tempo correr livre. E ir organizando o que vai surgindo ao seu tempo. A vida não tem fórmulas, as dicas nem sempre são úteis para todos. E os conselhos? Desses, duvido bastante. O que é bom para mim, nem sempre será o melhor para o outro.
Mas se tem algo em que acredito verdadeiramente é que todos temos em nós a capacidade de nos reinventarmos. E que nesse momento, as crianças estão nos salvando. São elas que têm nos vitalizado (mesmo em uma briga exaustiva entre irmãos, porque isso também é vida!). São elas que têm nos obrigado a sair dos noticiários e deixar os grupos de whatsapp, lugares onde, por extrema angústia ficamos insistentemente tendo que ficar. São elas que nos chamam para a hora do banho, para o almoço, para o jantar. E como elas são grandes inventoras de estórias e de tempos, será com elas também que vamos aprender a reinventar a nossa, que tristemente tem sido arrasada nos últimos dias. Vamos nos reabastecer desse combustível precioso que as crianças nos trazem e injetar o nosso cotidiano com eles.
É provável que dessa maneira o bolo preparado em plena tarde de segunda-feira, possa ter um gosto muito melhor. Um sabor de chocolate. Um sabor de vida pulsando.
Márcia Gonçalves Munhoz
Psic. Psicoterapeuta especialista em psicologia clínica pelo IEPP